SANGUE DE CAMPEÃO
Sobrinho do maior ídolo do automobilismo, Bruno Senna cresce a cada ano em sua carreira e segue um caminho de conquistas com a mesma garra, porém trilhando sua própria história.
Texto Luiz Aymar
O dia 1º de maio de 1994 ficou marcado na memória dos brasileiros. Como esquecer a data em que perdemos o tricampeão mundial de F1, Ayrton Senna, no trágico acidente em Ímola? Tido como um ídolo nacional, essa história não poderia acabar assim. Felizmente, seu legado continua. Com 24 anos, filho de Viviane Senna, Bruno mantém com orgulho o nome da família nas pistas. Com DNA de campeão, desde a infância ele vivencia o meio automobilístico de perto. O primeiro contato com as pistas foi aos 5 anos, quando sentou em um kart pela primeira vez. “Desde lá, sabia que seria um piloto como meu tio”, afirma. Apesar de correr desde pequeno, o jovem nunca entrou numa competição dessa modalidade. O acidente de Ayrton traumatizou a família, e o pequeno Senna parou de correr, “Porém nunca abandonei o sonho de chegar à F1”, finaliza.
Foi então que ele se afastou das pistas, sem saber ao certo o que o aguardava no futuro. Aos 18 anos, depois de todas as atribulações do acidente, Viviane questionou o filho sobre o que ele queria fazer da vida. “Respondi que queria ser piloto. Ela ficou surpresa, achou que era apenas algo passageiro, mas quando percebeu que o negócio era para valer, passou a me apoiar integralmente.”, conta.
Não acostumado com o forte impacto exercido pelo carro, ele começou a sentir no próprio corpo como é preciso muita força de vontade. “Comecei a quebrar uma costela depois da outra, e até hoje sofro com esse problema”, diz. Ultrapassando esses obstáculos com muita motivação e o auxílio do antigo amigo da família Gerhard Berger, o brilho do sobrenome começou a reluzir nos autódromos europeus. Competiu pela primeira vez na Fórmula BMW em 2004 a partir do segundo semestre. Lá não teve grandes conquistas, e no ano seguinte ingressou na Fórmula 3 Inglesa, onde, em 2006, subiu ao pódio. “Mostrei serviço e venci 5 corridas nesse ano”, completa.
A partir daí, o espírito de campeão começou a surgir nesse garoto de grande personalidade. “Acho que estou aprendendo bastante e os resultados vêm comprovando esse crescimento. Basta olhar o que fiz desde a estréia na Fórmula BMW até as poles e vitórias na F3. Mas também reconheço que ainda me falta experiência, e que preciso continuar me esforçando para completar a formação regular que não pude ter.”, fala.
Esse processo de amadurecimento se reflete nas pistas. Em 2007 estreou na Fórmula GP2 e logo na terceira corrida, realizada em Barcelona, conseguiu sua primeira vitória. Nessa temporada ele finalizou o ano em 8º. Na atual competição já colecionou outras vitórias, e a maior de todas não poderia deixar de ser a do Grande Prêmio de Mônaco. À la Ayrton, Bruno venceu a corrida de ponta a ponta, como na incrível época de ouro de seu tio nas ruas do principado onde ganhou de 1989 a 1993, além de 1987. Ainda para provar que a descendência é verdadeira, levou a melhor sobre seus adversários em Silverstone, Inglaterra, debaixo de uma enorme chuva. “Sem dúvida, foi o meu melhor momento até agora nas pistas, por tudo que envolve essa corrida”, se orgulha.
Por ser sobrinho do campeão, compará-lo a Ayrton é inevitável. Ver o sobrenome Senna de volta às corridas aumenta a ansiedade de testemunhar a bandeira nacional no ponto mais alto do pódio. A cobrança é comum, e para o jovem se torna uma moeda de dois lados: ao mesmo tempo que as atenções estão voltadas à exigência de um bom resultado, o nome facilita a abertura de portas de equipes e patrocinadores. “Essa relação, no entanto, tende a ser minimizada na medida em que construo a minha personalidade de piloto”, complementa. Além dos pés pesados no acelerador, ele se mantém firme e focado em sua realidade de experiência como piloto. O peso de ser um Senna parece não o incomodar, pelo menos por enquanto na Fórmula GP2. “Além disso, apenas o nome não vai me sustentar em categoria nenhuma. Tenho de mostrar serviço como qualquer outro.”, afirma.
Se depender do incentivo familiar, ele já seria o primeiro em todas as categorias. “Minha irmã Bianca é minha empresária e vai praticamente a todas as corridas. Minha mãe também está quase sempre nos autódromos, e várias vezes levam a Paulinha, minha irmã mais nova”, comenta.
Dessa forma, Bruno caminha para um futuro certo, que será a conquista do campeonato. Porém, ele é ponderado ao se tratar desse assunto. Por isso, não foi à toa que Bruno conquistou o segundo lugar na temporada 2008. O garoto prodígio ficou atrás apenas de seu maior rival, Giorgio Pântano, que possui 4 anos de experiência na categoria, mesmo período de toda a carreira de Bruno. Pântano, de 29 anos, 4 a mais que Senna, já tem em seu currículo passagem pela F1, portanto o segundo lugar pode ser considerado uma vitória. O título não chegou por pouco, falhas técnicas e acidentes como o atropelamento do cachorro na corrida da Turquia, tiraram a possibilidade de Bruno ultrapassar os 11 pontos de diferença de Pântano.
Mas isso não foi o problema. Mesmo como vice-campeão, segue querendo dar passos largos, e o sonho de chegar à F1 está cada vez maior. Leva uma rotina pesada de treinos, focando na preparação física e nas habilidades. Entrar na primeira categoria do automobilismo é para poucos. São 10 equipes e apenas 20 pilotos, em que a cada ano a renovação é muito pequena. “Estou procurando me preparar da melhor maneira possível para merecer uma chance, e se isso acontecer, agarrá-la com unhas e dentes.”, afirma.
Logo após o término do campeonato da GP2, o piloto declarou em seu site particular que “ser campeão poderia ter aberto mais portas nos meus passos futuros no automobilismo, mas pelo menos nenhuma se fechou”. Todas as escuderias estão atrás desse talentoso piloto, apenas Ferrari, Renault e Red Bull não manifestaram interesse. “Espero sentar em um assento competitivo da F1 ano que vem”, afirma.
Os brasileiros, acostumados a ser os primeiros, poderão, quem sabe daqui a alguns anos, se alegrar com a garra e a humildade de outro Senna no ponto mais alto do pódio. Se depender do empenho de Bruno, isso ocorrerá num futuro não tão distante. Para isso, ter o tio como referência é muito importante. “Mas estou procurando construir minha própria história”, termina.