- Seu espírito competitivo foi estimulado desde cedo, em simples brincadeiras com o jet ski, em Angra dos Reis.
E o ‘professor’ era ninguém menos do que o tio Ayrton Senna. “Mais competitivo do que ele não existia. E não era do feitio dele me deixar ganhar”, recorda Bruno Senna, hoje aos 25 anos.
A partir de segunda-feira, a ‘diversão’ do sobrinho do tricampeão mundial de F-1 será outra: pela primeira vez, Bruno testará um carro da categoria, no circuito de Barcelona, pela Honda. Vice-campeão da GP2, ele disputa uma vaga de titular com o brasileiro Lucas Di Grassi.
De Londres, Bruno falou por telefone, ao ‘Ataque’ sobre a expectativa pelos testes.
Relembrou bons momentos com o tio, e também os anos difíceis longe do automobilismo, depois da morte de Ayrton Senna no GP de San Marino, em 1994, e do pai, num acidente de moto.—Você está prestes a testar um Fórmula-1 pela primeira vez.
Está ansioso?—Estou superanimado para andar, ainda mais que estou há quase dois meses parado. Minha última corrida na GP2 foi no fim de setembro.
Todo piloto, no meu lugar, estaria doido para entrar no carro e dar uma acelerada.
—Como foram os dias na fábrica da Honda?
—Fiz tudo o que precisava antes dos testes, vendo os procedimentos de rádio, da parte eletrônica. É bem interessante ver como funciona uma equipe de F-1, muito diferente da GP2.
A fábrica da Honda tem uma estrutura bem legal e estou animado.
—Você vai disputar vaga com o Lucas para o lugar do Barrichello.
Como vê essa briga entre brasileiros?—Não existe briga entre brasileiros. A disputa é entre pilotos. É uma disputa direta.
Quem fizer o melhor trabalho vai ficar com a vaga.
—O Barrichello o aconselhou a não ir para a Honda, alegando que, com pouca experiência, seria queimar um cartucho.
Como você recebeu esse conselho?
—Acho que vai ser uma experiência fantástica participar do desenvolvimento do carro, ainda mais com o Ross Brawn (chefe de equipe), com quem tenho muito a aprender e que pode me ajudar a ir em frente. Agora, se é a equipe certa ou não, vou ter que esperar para ver.
—Mas é claro que você não vai seguir o conselho ...
—É lógico que não (risos). Vou pagar para ver.
—Mesmo testando com a Honda, ainda existe chance de ir para a Toro Rosso?
—Não fechei portas. Estamos vendo com a Toro Rosso a chance de testar, dependendo de como será na Honda.
—É verdade que você ofereceu US$ 14 milhões por uma vaga na Toro Rosso?
—É pura especulação. O que a Toro Rosso faz é pedir aos pilotos que levem patrocínio. Mas a realidade é que nunca ofereci 14 milhões para correr em lugar algum.—Está preparado para as comparações com seu tio?
—A realidade é que, se eu tiver que andar em 2009, vai ser por esforço e mérito próprios, não pelo sobrenome. As equipes não têm interesse em pilotos que não tenham realmente potencial. A pressão vai existir, ainda mais com os brasileiros, que são muito exigentes.
—Você se sente pronto para entrar na Fórmula-1?
—O desafio é imenso porque, na F-1, o nível técnico é muito grande. Tenho que aprender bastante, mas prefiro ser piloto titular do que pegar uma vaga como piloto de testes e não fazer muita coisa. Na minha carreira, quase sempre dei a cara para bater. Dei passos grandes e nunca caí. Os primeiros anos foram difíceis, mas hoje estou consciente do que posso fazer.
—Como foi o retorno ao automobilismo, depois de tanto tempo afastado?
—Com certeza, foram dois anos superdifíceis. Não tinha experiência de corrida, de como lidar com determinadas situações. E competia com pilotos com mais experiência do que eu, na Fórmula-BMW e na Fórmula-3. Hoje em dia, tenho vitórias e sei lidar com a dificuldade, com os momentos de decisão.
—Como foi ficar tanto tempo longe da pistas?
—Andei de kart dos 5 aos 10 anos. Mas, depois que o Ayrton faleceu, fiquei parado, mesmo. Foram oito anos e meio sem andar absolutamente de nada. De 2002 para 2003, voltei a correr de kart, mas quebrava mais costelas do que qualquer outra coisa. Com o tempo, fui sentindo cada vez mais falta do esporte, de correr. Aos 16 anos, via a molecada que andava comigo correndo de kart, e aquilo começou a me incomodar. Ficou bem difícil de aceitar quando comecei a ficar mais pró-ativo.
—Sua mãe, Viviane, tinha muito medo, não é?
—Ela tinha muito receio de eu começar a correr, pelo fator perigo. Ela ficou preocupada com o assédio da imprensa, com a pressão. E achava que era mais molecagem. Por muito tempo, não falei sobre isso com ela
—E quando você passou a dirigir no trânsito?
—É claro que tinha um histórico de acidentes na família, com a morte do meu pai também. Mas minha mãe sabia que eu tinha responsabilidade. Sofri um acidente na Fórmula-3, em 2006, que depois foi um alívio. A segurança no automobilismo, atualmente, é maior do que na época em que o Ayrton corria.
—Ela ainda fica muito nervosa nas corridas?
—Ela fica nervosa, claro. Mas a coisa boa é que a ansiedade dela hoje não é pelo medo de um acidente, mas pela expectativa de um resultado bom, de ficar pensando nos pontos do campeonato.
—A falta de experiência pode pesar na Fórmula-1?—Só correndo é que se adquire experiência. Estou bem tranqüilo. É difícil um piloto ter um sucesso enorme logo na estréia na F-1.
—Neste ano, você ganhou uma corrida da GP2 em Mônaco, onde seu tio venceu seis vezes. Foi a mais emocionante até agora?
—Ganhar em Mônaco foi realmente uma sensação muito especial. É um desafio completamente diferente, uma pista bem peculiar. Foi uma satisfação grande, uma experiência fantástica. Lembrei do Ayrton quando terminou a corrida e quando estava indo para o pódio. Mas desejo voltar a vencer em Mônaco na Fórmula-1.
—Quais pilotos admira?—O Felipe, o Hamilton. O Alonso, para mim, foi o melhor piloto da temporada. Tem o Kubica, o Vettel... A F-1 está num nível alto.
—E de todos os tempos, é o seu tio?—Minha grande referência é mesmo o Ayrton.
—Você tem características semelhantes às dele?
—Na família, temos várias características semelhantes, com personalidades parecidas, apesar de cada um ter sua individualidade. Então, posso falar alguma coisa ou ter um ponto de vista semelhante ao do Ayrton. Em termos de pilotagem, acho que a semelhança é de andar bem na chuva, naturalmente.
—Quais as recordações que você guarda dele?
—A maioria das memórias é das corridas. E, quando ele estava no Brasil, íamos para Angra ou para a fazenda. Era sempre uma diversão competitiva. Lembro das corridas de jet ski, ele me puxando de esqui. Ele tinha um jeito peculiar de estimular meu lado competitivo que era disputando comigo.
—E deixava você ganhar?
—Nada! Mais competitivo do que ele não existia. Não era do feitio dele me deixar ganhar. Tinha que suar bastante a camisa.
—Como é o seu dia-a-dia em Londres?
—Estou aqui há quatro anos e meio. Treino de manhã, almoço, depois tenho outro treino, volto em casa para jantar. Chego cansado e quero ver TV ou jogar video game. Às vezes, faço boxe. Gosto também de esportes aquáticos. Tem uma moça que faz comida. Moro com minha irmã, Bianca, que é minha empresária e faz toda a diferença.
O dia online.